RELÓGIO DO APOCALIPSE

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Pressionado pela maçonaria, Spínola nomeou Palma Carlos para primeiro-ministro


O Presidente da República rodeado dos membros do I Governo, após a posse. Da esquerda para a direita: Torres Campos, Maria de Lourdes Pintasilgo, Eduardo Correia, Raul Rego, António Galhordas, Sá Carneiro, António de Spínola, Palma Carlos, Álvaro Cunhal, Manuel Rocha, Mário Murteira, Pereira de Moura, Magalhães Mota, Vasco Vieira de Almeida, Almeida Santos, Mário Soares e Firmino Miguel ARQUIVO EXPRESSO/GESCO

Para chefiar o governo saído da revolução de 25 de Abril o Movimento das Forças Armadas propôs os nomes de Pereira de Moura, Raul Rego ou Miller Guerra. O Presidente Spínola não concordou. Ainda convidou o ex-ministro Veiga Simão, mas acabou por nomear Adelino da Palma Carlos, que lhe fora sugerido pelos dirigentes do Grande Oriente Lusitano
Em tempo de campanha para as presidenciais, o Expressorecorda alguns dos momentos mais importantes do Palácio de Belém, desde Spínola até aos dois mandatos de Jorge Sampaio. Este é o sexto episódio desta série de artigos.

Adelino da Palma Carlos foi o primeiro-ministro do I Governo Provisório formado após a revolução de 25 de abril de 1974. A escolha partiu do Presidente da República, general António de Spínola. Investido no cargo a 15 de maio, Spínola deu posse ao governo no dia seguinte.

Nos últimos 42 anos o país só conhecera dois chefes de Governo, designados presidentes do Conselho: Oliveira Salazar e Marcello Caetano. O novo primeiro-ministro era um ilustre desconhecido da opinião pública. Professor de Direito tal como os antecessores, Palma Carlos foi uma surpresa mesmo para os jovens capitães que derrubaram a ditadura.

Ainda antes do golpe, os militares reunidos no Movimento das Forças Armadas (MFA), já a pensar no day after, haviam transmitido a Spínola três nomes para primeiro-ministro do futuro governo. Eram eles: Francisco Pereira de Moura, economista e professor no ISE (atual ISEG), saído das fileiras do catolicismo progressista e que em 1969 fora um dos candidatos a deputado pela Comissão Democrática Eleitoral (CDE), uma das estruturas da oposição que disputaram o sufrágio para a Assembleia Nacional; o jornalista Raul Rego, diretor do vespertino oposicionista “República”, ligado à Maçonaria e ao recém-criado PS; e João Pedro Miller Guerra, professor de Medicina, um dos principais deputados da ala liberal eleitos para a Assembleia Nacional em 1969 mas que haviam entrado em rutura com Marcello Caetano.


Raul Rego, Francisco Pereira de Moura e Miller Guerra, os três nomes sugeridos pelo movimento dos capitães a Spínola para primeiro-ministro de um futuro governo ARQ. A CAPITAL/IP E ARQUIVO EXPRESSO/GESCO

Nenhum destes nomes fazia parte dos planos iniciais de Spínola, que chegara a pensar num “governo militar de breves meses” – como disse na sua última grande entrevista, ao Expresso, em 1994. Não podendo ser militar, “a minha escolha pessoal era Veiga Simão, mas ele e eu, em conversa havida no dia 26 de abril, concordámos em que não seria exequível nem sensato tentar uma solução desse tipo”.
SPÍNOLA RECUSA OS TRÊS NOMES INDICADOS PELO MFA

A Comissão Coordenadora do MFA envolveu-se também na escolha do primeiro-ministro. “Foram horas e horas de audição de personalidades”, refere Melo Antunes, o principal autor do Programa do MFA, em entrevista a Maria Manuela Cruzeiro (“O Sonhador Pragmático”). Ouvidos não apenas os três nomes sugeridos, mas ainda João Salgueiro e Rui Vilar.

No seu livro “País sem Rumo”, Spínola descreve a sua seleção de nomes para primeiro-ministro. Após uma conversa com Pereira de Moura, pediu-lhe “um memorial”, cuja leitura “revelou uma total descoordenação de ideias, demonstrativa da sua incapacidade para o desempenho do cargo”. Além disso, em sua opinião, o economista era “claramente de formação comunista”. Quanto a Miller Guerra, “ao impor como condição a entrega imediata do Ultramar, obviamente afastou qualquer hipótese”. Esta foi, de resto, a razão de fundo que levou o professor de Medicina a não aderir ao PPD de Sá Carneiro e Pinto Balsemão, para o qual foi insistentemente convidado pelos ex-colegas da bancada liberal, e a aproximar-se do PS.

Finalmente, Raul Rego. O historiador Luís Rodrigues diz na sua biografia de Spínola que o diretor do jornal “República” “nem sequer foi contactado” pelo Presidente da República, o que o próprio teria justificado por carecer de “características de liderança indispensáveis” para o lugar.

RAUL REGO PROPÕE PALMA CARLOS EM REUNIÃO MAÇÓNICA

Raul Rego, porém, na sua última entrevista (ao Expresso), explica que “foi a Maçonaria que escolheu e indicou” Palma Carlos para primeiro-ministro. Rego conta que, numa reunião com Spínola, “ele disse-me que ‘precisamos de si para primeiro-ministro’. Não respondi logo. À noite, houve uma reunião em casa do Dias Amado”, o então grão-mestre do Grande Oriente Lusitano, na Av. Manuel da Maia. “‘Eles querem o Rego para primeiro-ministro’, informou o Dias Amado. ‘Não’, disse eu: ‘o primeiro-ministro deve ser o Adelino, que tem experiência e formação jurídica, e até um nome como jurista que o impõe’. (…) É claro que isso não está contado, não sei porquê. Mas foi a Maçonaria que indicou o Palma Carlos”.


Professor Adelino da Palma Carlos, primeiro-ministro do I Governo Provisório ARQ. A CAPITAL/IP

Advogado e catedrático da Faculdade de Direito de Lisboa, Palma Carlos era um democrata, ainda que sem assinalável currículo na luta contra a ditadura. No dizer de Spínola, era um professor “altamente prestigiado e com grande tradição democrática e liberal”.

Para Maria Inácia Rezola, “a escolha do primeiro-ministro constitui o primeiro choque institucional” entre Spínola e o MFA. No seu livro “15 de Abril. Mitos de uma revolução”, a historiadora diz que se tratou do “primeiro round da dura luta” que se prolongou até ao fracassado golpe de 11 de março do ano seguinte.

ÁLVARO CUNHAL MINISTRO DO I GOVERNO

O Governo integrou ministros pertencentes a quatro partidos: PS (com 3 ministros), PPD (2), PCP (2) e MDP/CDE (1), que se envolveram através dos respetivos líderes (Mário Soares, Francisco Sá Carneiro, Álvaro Cunhal e Pereira de Moura). Havia ainda vários militares, bem como civis com um acentuado perfil técnico e/ou pertencentes à Sedes (Sociedade de Estudos para o Desenvolvimento Económico e Social), como Rui Vilar.

A grande surpresa foi, naturalmente, a participação do PCP, que fora o inimigo de estimação da ditadura. Incluindo o próprio secretário-geral, Álvaro Cunhal, regressado do exílio logo a seguir ao 25 de Abril. Spínola começara por convidar Cunhal para ministro do Trabalho, mas acabou por entrar no Executivo como um dos três ministros sem pasta. Para o novo Ministério do Trabalho, que substitui o velho Ministério das Corporações, foi nomeado outro militante comunista: Avelino Pacheco Gonçalves, dirigente do Sindicato dos Bancários do Porto e um dos quadros da semiclandestina Intersindical. Também ele de formação católica, Avelino foi indicado pela própria Inter e pelo PCP, após a recusa de Francisco Canais Rocha, o primeiro líder da central sindical.


O secretário-geral do PCP, Álvaro Cunhal, toma posse como ministro sem pasta do I Governo Provisório ARQUIVO EXPRESSO/GESCO

A inclusão do PCP e do próprio Cunhal no Governo Provisório fora uma condição colocada pelo PS de Mário Soares, para quem era indispensável “comprometer” os comunistas no poder saído da revolução. “Nós quisemos que o ministro do Trabalho fosse um comunista” – explicou Soares a Maria João Avillez (in “Soares. Ditadura e Revolução”). “Justamente por pensarmos que os comunistas poderiam conter o radicalismo emergente na sociedade portuguesa, após quase meio século de ditadura. Teria sido esse o seu papel histórico. Como o PCF, em França, após a libertação.”

À mais velha ditadura da Europa ocidental seguia-se o primeiro Governo de um país da NATO com a participação de comunistas, ainda por cima completamente alinhados com a União Soviética.

No discurso de tomada de posse, Spínola reiterou as suas teses federalistas já apresentadas no livro “Portugal e o Futuro”, umbest-seller lançado em fevereiro e que tornara pública a sua rutura com o regime ditatorial. Reconheceu o “direito de todos os povos à autodeterminação”, adiantando, no entanto, que a opção “terá de ser feita, não entre duas alternativas apenas, mas entre todo um leque de viabilidades”. Significativamente, não falou em independência.

PROGRAMA DO GOVERNO FEITO POR FREITAS DO AMARAL

Para Melo Antunes, um dos principais nomes da Comissão Coordenadora do MFA, o I Governo foi “formado, fundamentalmente, pela vontade do Spínola”, tendo silo “acolitado”, entre outros, por Veiga Simão, que lhe deu “uma colaboração muito forte e muito ativa”.

Último ministro da Educação do Estado Novo, Simão era amigo pessoal de Spínola que, não podendo contar com ele para primeiro-ministro, o chamou para elaborar o programa do I Governo.

Envolvido no processo de redação do programa esteve Diogo Freitas do Amaral, antes ainda de fundar o CDS. No seu livro de memórias “O Antigo Regime e a Revolução”, Freitas conta que Veiga Simão “utilizou o método que sempre usara no Ministério da Educação: pediu textos a várias pessoas da sua confiança, para depois os trabalhar e fundir num documento final”. Um dos colaboradores a que recorreu foi Adelino Amaro da Costa, que trabalhara com ele no Ministério da Educação e que, por sua vez, contactou Freitas, pedindo-lhe “para conceber e redigir” o programa. “Deitei logo mãos à obra. E em 24 horas o projecto estava pronto”. Na redação do futuro candidato à Presidência da República, o programa “só continha uma medida que podia ser considerada de esquerda – a nacionalização dos bancos emissores: Banco de Portugal, Banco de Angola e Banco Nacional Ultramarino”. Melhorado por Amaro da Costa, futuro número dois do CDS, o documento foi entregue a Veiga Simão “que o retocou no que entendeu e, nomeadamente, em matérias de educação, ciência, políticas sociais e política ultramarina”.


Primeira reunião do Conselho de Ministro do I Governo Provisório, a 17 de Maio de 1974, em São Bento ARQ. A CAPITAL/IP

Curiosamente, o programa do governo não foi aprovado pelo Governo, mas pela Junta de Salvação Nacional, pelo decreto-lei nº 203/74, de 15 de maio. Esta singularidade explica que Mário Soares não recorde sequer a sua existência: “Posso asseverar que nunca ouvi falar em tal programa – nem eu, nem o [Salgado] Zenha, nem o Rego, que éramos ministros socialistas desse I Governo”.

VEIGA SIMÃO DESMENTE FREITAS

Segundo Freitas, o texto do programa “não difere em mais de uma dúzia de pontos (…) da versão inicial por mim pensada e redigida”. Veiga Simão sempre contrariou esta versão do fundador e ex-líder do CDS. Reivindicando a principal autoria do programa, chegou mesmo a elaborar um texto comparando as várias versões do documento. Numa entrevista a Jorge Cotovio, para a sua tese de doutoramento sobre o ensino privado, deu a sua versão sobre o convite que lhe foi endereçado por Spínola para elaborar o programa de governo: “Aceitei o encargo e nesse mesmo dia defini com Spínola os temas dos 'capítulos' a desenvolver no programa. Trabalhei durante quatro dias, fechado em casa. Consultei vários amigos que trabalhavam comigo na Educação, e outras personalidades, algumas que vieram a ser nomeadas ministros por minha indicação. Finalizei o documento sem que alguém me transmitisse qualquer participação escrita. O programa foi aprovado com algumas alterações.”

A influência de Veiga Simão ficou patente na escolha, por exemplo, de Almeida Santos para ministro da Administração Interterritorial. Como recordou Mário Soares, este advogado de Moçambique “entrara no Governo sem sabermos bem como. Só mais tarde viemos a saber que fora sugerido a Spínola por Veiga Simão, uma das ‘éminences grises’ que estiveram na base da formação do Governo”.

Spínola, aliás, nunca desistiu de ter a colaboração ativa de Veiga Simão, nomeando-o mais tarde representante permanente de Portugal junto das Nações Unidas, em Nova Iorque. O Presidente impôs-se mesmo ao ministro dos Negócios Estrangeiros. Soares tencionava nomear Jorge Sampaio para aquele importante posto diplomático e até já o enviara em missão especial à ONU, acompanhado de João Cravinho.

UM GOVERNO DE 55 DIAS

O Governo de Palma Carlos durou escassos 55 dias. Para Soares, o chefe do Governo “possuía pouca experiência política” e “conhecia mal as questões concretas e emergentes da governação e da administração”. No entender de Álvaro Cunhal, Spínola tratava Palma Carlos “como se este fosse um seu soldado”. O autor de “A Verdade e a Mentira na Revolução de Abril” conta que o general do monóculo “tinha uma linha telefónica direta para o primeiro-ministro e, em pleno Conselho de Ministros, chegavam ordens do presidente da Junta de Salvação Nacional. E que ordens!”. Colegas na Maçonaria e no Governo, Raul Rego admite que Palma Carlos “não correspondeu” ao que dele esperava. “Tinha um defeito tremendo, que era a vaidade.”


Palma Carlos foi primeiro-ministro por 55 dias. Seguiu-se à frente do governo Vasco Gonçalves ARQUIVO EXPRESSO/GESCO

Palma Carlos tentou reforçar substancialmente quer os seus poderes de primeiro-ministro, quer os do Presidente. Sem êxito. O malogro do que ficou conhecido como “golpe Palma Carlos” levou-o a apresentar a demissão, a 9 de Julho. Para primeiro-ministro do II Governo Provisório foi escolhido alguém com um perfil diametralmente diferente: o coronel Vasco Gonçalves, que esteve à frente dos quatro executivos seguintes.

fonte: Expresso

Coreia do Norte. O país onde a internet é um Big Brother

Coreia do Norte. O país onde a internet é um Big Brother

A net dos norte coreanos é peculiar e está a espiar os utilizadores a todo o momento.

Pegar nas ferramentas destinadas a assegurar a liberdade de expressão e virar tudo ao contrário.

Foi o que a Coreia do Norte fez ao pegar no software de uso livre Linux para criar o Estrela Vermelha, o único sistema operativo usado no país e que não se liga à world wide web – apenas um grupo muito restrito tem acesso à internet a nível mundial.

A net usada no país, a Kwangmyong, é basicamente um sistema interno (uma intranet, que no mundo ocidental é usada dentro de empresas, por exemplo) e não permite que os utilizadores domésticos acedam a sites estrangeiros.

Em 2014 houve uma fuga para o exterior da versão 3 do Estrela Vermelha e dois investigadores alemães estudaram-no profundamente. Niklaus Schiess e Florian Grunow apresentaram agora a suas conclusões ao congresso Caos Communication, este fim de semana em Hamburgo.

Apesar de o código ser Linux, o sistema operativo é único. A revista online Motherboard explica que “vem com tudo que um utilizador pode precisar, incluindo um processador de texto e software para a criação de música”. Como motor de busca, usaram novamente outra ferramenta de uso livre, um Firefox modificado.

“É baseado no Linux e tem a aparência de um Mac [ da Apple]”, explicam os investigadores, adiantando ainda porque se deram ao trabalho de explorar ao detalhe o sistema operativo deste regime ditatorial.

A Coreia do Norte “viola os princípios do software livre para criar um sistema operativo que suprime a liberdade de expressão”. Agora, querem revelá-lo ao público e ensinar como se podem “contornar as limitações introduzidas pelo regime”.

Basicamente, é um sistema “desenhado para se defender e proteger de tentativas de alteração” vindas do exterior e que permite invadir a privacidade dos utilizadores.

Citado pelo Guardian, Grunow disse que “talvez queiram ser independentes de outros sistemas operativos para não deixar portas abertas” à espionagem.

Mas o principal objetivo dos alemães foi investigar as violações da privacidade e o controlo dos utilizadores pelas autoridades. E descobriram que “as funcionalidades implementadas no Estrela Vermelha são o sonho molhado de um ditador à frente um estado super controlador”.

Tão persecutório, que permite “marcar e seguir o percurso de documentos ou ficheiros multimédia”, como filmes, textos ou música ‘subversiva’ vinda do estrangeiro.

fonte: Sol

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